O texto da semana é de nosso convidado João Aurélio, que com seu regionalismo brasileiro sempre que lhe é possível escreve algo aqui no nosso Blog. Marinheiro e ex- imigrante, Aurélio fala do orgulho de ser de uma região pobre do brasil e nos conscientiza que devemos mostar e bem o que temos , os nossos tesouros culturais. se não dermos o devido valor , quem o fará?
"O homem cria estereótipos como forma de
expressar mentalmente uma imagem ou pensamento sobre alguma coisa. Esses
estereótipos são, muitas vezes, preconceituosos.
Lembro que, certa vez, em 2007, um casal de
cariocas me perguntou em que parte do Brasil eu nascera. Ao responder que era
da Paraíba a senhora me disse:
- Fale alto. Diga com orgulho: Eu sou da
Paraíba!
Eu fiquei realmente surpreso com a atitude
daquela senhora, pois se falei baixo assim o fiz porque é de minha natureza.
Ainda mais estávamos numa igreja, pelo que devíamos silêncio. Se me fosse
incômodo dizer que sou paraibano, eu ainda poderia ter dito que sou de outro
estado...
O fato é que aquela senhora tinha uma imagem
bem carregada de preconceito sobre pessoas que não tivessem nascido nas regiões
mais abastadas do Brasil. O que ocorrera testifica tal fato.
Mais importante do que aquilo que as pessoas
pensam a nosso respeito, é aquilo que nós pensamos sobre nós próprios. Isto sim
é o que faz toda diferença, pois a partir da idéia que fizermos sobre nós,
podemos influir na construção da idéia que outros fazer a nosso respeito. Se a
desfiguram e passamos a acreditar na imagem desfigurada, perdemos o foco do
valor que temos, e isto é desastroso sobre todos os aspectos.
Diariamente somos bombardeados pela grande
mídia a dizer o que devemos dar valor. As novelas, quando querem falar de algo
que é chique, reportam-se a Paris, Londres, Nova Iorque, etc. Nos telejornais,
quando querem falar de povo inteligente falam do Japão ou EUA. E não quero
dizer que estes países citados não sejam merecedores daquilo de bom que se diz
sobre eles, no aspecto do desenvolvimento tecnológico, por exemplo. O que
retifico sobre a atuação da mídia é a supervalorização daquilo que é de fora em
detrimento daquilo que é nosso.
Participei, na década de 90, em Camalaú,
Paraíba, dum seminário sobre desenvolvimento, no qual se falava sobre turismo
na Microrregiãodo Cariri Ocidental da Paraíba. Um dos palestrantes era o padre
João Jorge, de nacionalidade holandesa, o padre que oficiava as missas na
Paróquia de São Sebastião do Umbuzeiro, a qual ainda pertence Camalaú.
Na ocasião, disse-nos que os seus amigos
holandeses que visitavam o cariri ficavam encantados pela região,
particularmente, pela culinária, pela beleza natural e principalmente pelo
acolhimento do povo.O Pe. João opinava que um projeto turístico aproveitando o
potencial do cariri, se bem feito, atrairia turistas da Europa e de outros
lugares. Esse fatores: o calor, a beleza natural, a hospitalidade do povo, e
algumas coisas mais, tudo isso, no seu conjunto, encantava seus amigos e
familiares holandeses.
Já li que o imperador D.Pedro II, quando no
exílio na França, dizia sentir saudades do sol do Brasil. Isto dito por alguém
que exerce algum cargo político, a gente até pode achar que se trata dum
discurso poético para agradar ao ouvinte, só que há toda verdade nas palavras
de D. Pedro II, e os 5 anos que vivi em Portugal, me fizeram entender por que
D. Pedro II sentia falta do sol do Brasil e ainda entendi de forma mais apurada
as palavras do padre João.
Em 2007, eu morava em Braga, Portugal, norte
daquele país, e para ganhar o pão de cada dia, como diz um amigo meu, trabalhei
por alguns meses como pintor de residências. Trabalho comum entre os
imigrantes. Estava dentro da residência na qual trabalhava quando vi, pelos
vidros da janela, alguns raios do sol. Fiquei extasiado! Sai e sentei-me um
pouco, só para apreciar aqueles raios solares. Fiquei ali por alguns minutos.
Naquele momento, apesar da beleza do sol e dum céu completamente azulado, a
temperatura devia estar pelos 3º ou 5º (graus). Um frio de torá, como falamos
no cariri.
Naquela temperatura ou um pouco mais acima
dela, vive-se, no mínimo, 1/4 de ano em Portugal. Na França costuma ser mais
frio. Daí, o porquê D. Pedro II sentir saudades do sol do Brasil como também é
uma das razões dos holandeses adorarem as terras caririzeiras, de temperaturas
mais altas durante o dia e aquela brisa maravilhosa durante à noite. Naquele
momento, fiquei a refletir sobre esses fatos, sobre as palavras do Pe. João e a
citação de D. Pedro II.
Isto nos leva a pensar que a atividade
turística na região é algo perfeitamente aplicável. No entanto, se fala muito
nisto e não preparam os munícipes na extensão devida.
Hoje, já vemos algumas ações quanto ao
desenvolvimento de projetos turísticos na região do cariri. Entretanto, é
necessário conscientizar as pessoas sobre o assunto. As escolas deviam ter mais
conteúdo quanto à história regional e municipal; ter mais atividades
extra-curriculares neste sentido. Isto seria bom para que a juventude nativa
conhecesse melhor o lugar que reside e se preparasse para descobrir as botijas
escondidas na sua região. Caso isso não aconteça, vai ter que percorrer o
caminho de Santiago, não o de Compostela, mas o do personagem Santiago do livro
de Paulo Coelho, “O Alquimista”. Santiago após andar “meio mundo” a procura de
um determinado tesouro, descobre que aquilo que procurara sempre estivera no
“terreiro” de sua casa. Portanto, encontremos e arranquemos as botijas da nossa
região antes que outros o façam."
Texto; João Aurélio
Nota explicativa; Paulo Medeiros
Foto: web